domingo, 9 de dezembro de 2007

"Fofoca com cabeleireiros acontece em salões de beleza mais baratos"

"Não tenho condição de aconselhar uma pessoa sobre isso", diz o cabeleireiro Mario Russo quando uma das clientes de seu salão de beleza em Boston se queixa das crianças. Ou, se uma freguesa fala mal do ex-marido, ele costuma dizer que "esse tipo de assunto é coisa para outro tipo de profissional", e emenda com uma pergunta sobre que produtos de cabelo ela costuma usar.
"Elas podem ficar magoadas com isso, mas de qualquer jeito não se trata de um relacionamento que eu gostaria de manter profissionalmente", ele afirma. "Existe um certo tipo de cliente que vai ao cabeleireiro construir um relacionamento assim. Para mim, isso quer dizer que perco a cliente na segunda visita. Elas percebem que não me interesso por conversa desse tipo. Não estou sendo pago para dar conselhos sobre os casamentos das pessoas ou o comportamento de suas crianças".
Russo, cujo salão de beleza ostenta paredes caiadas de branco e decoradas por trabalhos de arte contemporânea, é a antítese do cabeleireiro tagarela e cheio de conselhos que muitas freguesas de estabelecimentos como o dele se acostumaram a encontrar. Filmes como Shampoo e Flores de Aço perpetuaram a idéia de que o cabeleireiro deve funcionar também como confidente - e a maioria dos profissionais do ramo terminou por incorporar esse clichê, ainda que obviamente não transformem a proximidade em uma arma de sedução, como o personagem de Warren Beatty fazia em Shampoo.
Ainda assim, existe um pequeno número de cabeleireiros de alto preço, em salões nos quais o preço por um corte é de pelo menos US$ 100, que preferem recusar o papel adicional de melhor amigo da cliente. Afinal, por que um profissional que têm seu nome no luminoso de um salão e cobra por seu trabalho o preço equivalente ao de um bom jantar não deveria ter autoridade para dizer a uma cliente que prefere não ouvir detalhes sobre a vida sexual dela?
As justificativas que alguns dos cabeleireiros de mais alto preço empregam para desencorajar confidências variam. Sua clientela muitas vezes inclui celebridades e executivas, que exigem discrição; qualquer informação suculenta revelada no salão poderia ser transmitida via BlackBerry ao mundo inteiro, por uma desconhecida sentada na cadeira ao lado. Além disso, se torna mais fácil divulgar os produtos de cuidados capilares que esses cabeleireiros desenvolvem ou assinam caso a conversação se mantenha profissional.
E, em certos casos, os estilistas são tão influentes quanto suas clientes mais famosas, de modo que se sentem no direito de exigir que a clientela se conforme em receber apenas o corte de cabelo de alta qualidade pelo qual está pagando.
Sally Hershberger, proprietária do salão de beleza que leva seu nome em Nova York, diz que tende a reprimir o papo furado quando está trabalhando, porque conversa sem sentido dificulta sua concentração no trabalho.
"Elas têm sorte se conseguem me fazer dizer uma palavra", disse Hershberger. "Conversar é uma distração grande demais. O que elas costumam esquecer é que estou trabalhando com instrumentos afiados". Anos atrás, quando suas clientes se recusavam a ficar quietas mesmo que ela pedisse, a cabeleireira decidiu colocar uma placa pedindo silêncio, que ficou na parede do salão por algum tempo.
"Ninguém que trabalhava comigo acreditou que eu tivesse coragem de fazer aquilo", ela diz. "Mas agora minhas clientes costumam respeitar minha preferência".
Nos salões em geral, os cabeleireiros que preferem que suas clientes não lhes contem seus problemas são tão raros quanto aqueles que acreditam em loiras naturais. "Se o profissional não deseja passar o dia todo conversando com um monte de gente, a impressão dominante é a de que ele não vai se enquadrar muito bem em qualquer salão", disse Gordon Miller, diretor executivo da Associação Nacional de Cosmetologia, que congrega os profissionais norte-americanos do setor.
Em entrevistas com cerca de uma dúzia de proprietários de salões com preços inferiores a US$ 100 por um corte, em diversos locais dos Estados Unidos, nenhum disse que costuma tentar dissuadir as clientes de revelarem detalhes sobre suas vidas pessoais. "Estamos no ramo há mais de 20 anos, a essa altura nossas clientes são praticamente nossas amigas", disse Patty Miller, proprietária do salão Big Hair, em Chicago. "Nós somos convidadas para os seus casamentos. Elas nos contam sobre o nascimento de seus bebês. As pessoas desejam ter um relacionamento desse tipo com sua cabeleireira".
Os cabeleireiros que desencorajam revelações pessoais afirmam que o objetivo deles não é criar uma impressão de rudeza. Simplesmente preferem que seu trabalho seja tratado como o de qualquer outro prestador de serviços, como um empreiteiro ou proprietário de bufê.
"Eu explico aos meus funcionários que eles não precisam se manter distantes", conta Russo, cujo salão cobra US$ 250 por corte. "Mas existe um determinado limite que é preciso deixar claro. É preciso assegurar que a cliente esteja recebendo o melhor serviço que o salão pode fornecer, e isso inclui, por exemplo, que não nos preocupemos com a possibilidade de magoar alguém ao sugerir que uma mudança de corte é necessária".
fonte: The New York Times

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